A estátua do Cristo Redentor na entrada da cidade esconde o clima de apreensão que vive a população de Quirinópolis, a 285 quilômetros de Goiânia, no Sudoeste goiano. O elevado índice de homicídios neste ano deixou a aparente calmaria da cidade sob um medo mudo. Somente neste ano, foram 16 assassinatos. No ano passado inteiro, foram 38. O número de homicídios nos dois meses de 2015 é a metade do total de 2013: 32. O tráfico de drogas é apontado como o principal responsável pela escalada de violência.
A noite de segunda-feira deixou o clima ainda mais pesado. Por volta das 21h30, Rouver Oliveira da Silva Maciel, Lucas Soares da Silva e Alan Fernandes da Silva Júnior chegaram na porta do supermercado em um Fiat Strada branco. Rouver dirigia o carro e os dois amigos estavam na carroceria. Assim que pararam, Lucas e Alan desceram armados com revólveres calibre 38 atirando contra o proprietário do supermercado, o ex-policial militar Denivaldo Lopes Terra, de 49 anos, e contra o irmão dele, o carteiro Wesley José Lopes, de 47.
Denivaldo, conhecido por Terra, estava armado e acabou trocando tiros com o grupo, ferindo Allan na barriga. Denivaldo e Wesley ainda foram socorridos por uma equipe do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) e levados para o Hospital Municipal, onde acabaram morrendo. Denivaldo foi atingido por quatro tiros nas costas e Wesley por três tiros nas costas. Os atiradores fugiram levando Alan até a porta do hospital e cada um foi para uma casa se esconder. Rouver se escondeu na casa de um amigo no Setor Capelinha.
Horas mais tarde, Fabrício Araújo de Souza, conhecido como Fabinho, tido como um sobrinho para Terra, e o cabo da Polícia Militar Claudinei Lourenço de Souza foram até a casa onde estava escondido Rouver e se identificaram como policiais. Eles entraram na casa e foram recebidos a tiros por Rouver, que matou Fabrício e baleou o militar no rosto. No momento do tiroteio, Lucas chegava no local e acabou baleado no braço direito. Claudinei ainda reagiu e baleou Router no pé, mas o homem conseguiu fugir para um matagal próximo da casa.
Alan acabou preso no hospital, Lucas foi preso de madrugada pela PM e Rouver em um matagal no Conjunto Castelinho pela Polícia Civil ontem cedo. Alan e Lucas foram autuados em flagrante por duplo homicídio qualificado, e Rouver por triplo homicídio qualificado e tentativa de homicídio contra Claudinei.
Eles confessaram os crimes e disseram que Terra os havia ameaçado de morte antes. Rouver tinha passagens na polícia por homicídio, Lucas por furto e Alan por tráfico de drogas.
O duplo assassinato no Supermercado Terra abalou ainda mais a tênue paz que a cidade de 70 mil habitantes guardava. Mesmo os policiais do 12º Batalhão da Polícia Militar (BPM) não escondem a tensão. Os dois carros e o pequeno efetivo de agentes não parecem dar conta das idas e vindas das disputas pelo tráfico na cidade. Nomes de traficantes e episódios de violência se embolam nas diferentes histórias que os próprios policiais contam.
Um deles afirma que a falta de comando e o pouco efetivo já não dão conta dos números de ocorrências registradas. A Delegacia da Polícia Civil, mesmo após o assassinato de segunda-feira, tem as portas fechadas após as 18 horas, com delegado plantonista chamado somente em emergências. A cidade também não tem juiz efetivo. A autoridade se faz presente pelo Ministério Público do Estado de Goiás (MP-GO), que conta com um promotor de justiça no Município. “Estamos sem comando, ficamos aqui à mercê dos acontecimentos”, relatou um policial à reportagem.
Quando a própria polícia está sem grandes esperanças, resta pouco para a população. Amedrontada, uma vizinha do Supermercado Terra não se esquece do momento do crime. Estacionava o carro na garagem quando ouviu os tiros. Restou se abaixar no carro e esperar tudo acabar. “Foram vários tiros. Havia acabado de chegar em casa, fiquei amendrontada. Inclusive falar com a imprensa também acaba sendo um risco que posso estar correndo”, disse. Fechou o portão de casa e entrou sem querer se identificar.
A marca de tiros na parede do supermercado e o aviso de luto tornam o local ainda mais lúgrube. Conversa sobre o duplo assassinato e outros crimes ocorridos durantes os últimos meses são ouvidos por toda a parte. Todo mundo parece conhecer alguma vítima. A comerciante Zulene Macede, de 46 anos, é uma delas. Relata que o tráfico de drogas parece ter migrado de Rio Verde para Quirinópolis nos últimos anos. “A droga tomou conta da cidade. Antes tínhamos sossego, agora é só roubo e matança”, diz. A sobrinha dela era noiva de Wesley e iria oficializar o casamento no próximo dia 21.
Logo após os assassinatos, uma rádio local pedia a população que não saísse de casa. “Diziam que havia uma guerra entre gangues locais”, contou uma moradora da cidade.
Uma audiência pública com diferentes autoridades da região foi marcada para a próxima sexta-feira para discutir medidas para conter a violência. Uma caminhada da paz também deve percorrer as ruas da cidade. O velório dos irmãos assassinados, realizado na Sala de Velórios Municipal, durou todo o dia de ontem e varou a madrugada. Hoje os corpos serão sepultados no cemitério da cidade.
Equipes da Polícia Militar, ganharam reforço de policiais da Companhia de Patrulhamento Especializado de Rio Verde, de policiais do Grupo de Operações de Divisas e de PMS de outras cidades. A mudança de comando da 12ª Companhia Independente da Polícia Militar já foi providenciada pelo comando geral da corporação. Sai do capitão Valteir de Souza Silva e entra o major Jeovaldo Ataídes.
Ontem, o delegado regional de Rio Verde, Danilo Fabiano disse que uma força-tarefa com cinco delegados e 20 agentes foi formada na cidade para resolver os assassinatos do ano passado e deste ano.
FONTE:O POPULAR